Reflexões Atuais sobre Fertilidade – Licões do início do século XXI

Para finalizar este ano, uma reflexão de como está nossa fertilidade nos dias atuais.
Nascido em 1978, o primeiro bebê de proveta, inaugurou uma nova era na medicina reprodutiva. Éramos capazes de gerar vidas em laboratório. De lá para cá muito se avançou, mas havia e há uma grande expectatica quanto ao futuro. Como estaríamos no novo século? As expectativas eram enormes, achávamos que seríamos capazes de “criar” o ser humano perfeito, imaginávamos em nossa vã ilusão que a infertilidade virasse coisa do passado. Porém, diversos aspectos interferiram nos avanços ligados à fertilidade. Aspectos éticos, morais, filosóficos, técnicos e da nossa própria natureza e do meio-ambiente que nos cerca.
Avançamos muito, mas não contávamos com fatores simples, que desconhecíamos e outros que nem conhecíamos, como a recente epidemia de zika vírus. Como imaginaríamos que em pleno século XXI, um vírus fosse afetar o fruto de nossa fertilidade? Como lidar com um inimigo praticamente invisível? Nunca imaginávamos que diante de tantos avanços tecnológicos, um vírus vindo dos confins de uma selva africana provacaria tantos problemas. Isso mostra o quanto somos frágeis. A epidemia de zika é real, ameaça a saúde e a vida de futuros seres humanos e precisamos aprender a viver em tempos de zika. Não podemos impeder ou evitar que toda uma geração de casais tenham filhos, temos que usar estratégias para vencê-lo. Para quem decidiu pela gravidez, a proteção constante contra o mosquito transmissor, para quem quer adiar a gravidez, o uso da tecnologia, congelar óvulos e embriões, caso contrário teremos uma população envelhecida no futuro tentando engravidar com muitas dificuldades e com risco maior de gerar filhos com alterações genéticas. Não podemos nos acovardar diante deste problema.
O surgimento da epidemia do zika vírus, com a possibilidade de congelamento de óvulos e embriões, teve pelo menos um efeito positivo. O aumento da divulgação da importância de se preservar a fertilidade.
Antes e mais problemático que o zika vírus, o grande desafio deste início de século para a medicina reprodutiva é a idade em que estamos buscando nossas gravidezes. Cada vez mais, o meio moderno de vida que levamos, nos obriga a privilegiar o estudo, o trabalho e a busca num mercado de trabalho cada vez mais concorrido que impede muitos de pensar em procriar antes do que seria considerado ideal. A postergação da gravidez após os 35 anos, sobretudo da mulher, mas também do homem, na vã ilusão de que os tratamentos de medicina reprodutiva irão resolver todos os problemas é um erro. Nem mesmo técnicas avançadas, como a fertilização in vitro, são capazes de supercar os efeitos maléficos do envelhecimento de espermatozoides e sobretudo óvulos. A idade avançada é sem dúvida alguma uma “epidemia” muito mais grave e prejudicial à fertilidade humana, que o zika vírus. Não há nada em medicina reprodutiva que seja mais traumático que os efeitos ruins ocasionados pela idade avançada. Querer postergar a gravidez é um direito e muitas vezes a única opção para muitos, mas posterguemos com segurança e sem riscos, usemos o congelamento de óvulos, espermatozoides e embriões para preservar com segurança nossa fertilidade.
O segundo ponto mais importante para a fertilidade, são nossos hábitos de vida. Por todas as facilidades que a tecnologia nos proporciona, comemos mais e pior e  nos movimentamos menos, além de estarmos constantemente expostos a toxinas em todas as esferas do dia-a-dia. Nas grandes cidades respiramos um ar inimaginável de existir há um século, alimentos com conservantes, corantes, sabores artificiais são uma constante, vivemos o século do fast-food. A grande maioria não pratica atividades físicas e os que o fazem, em geral, o fazem de maneira irregular. Bebe-se e fuma-se mais e isso desde a juventude. Nunca estivemos tão acima do peso, a obesidade é também uma epidemia. Tudo isso afeta negativamente nossa fertilidade e faz com que as taxas de gravidez natural e por tratamentos caiam muito.
Vivemos uma época em que apesar da conscientização sobre as DSTs, há uma epidemia de HPV e outras DSTs, como o HIV. Os números não param de crescer, cada vez mais jovens e adultos se contaminam e isso reduz muito a fertilidade. Existe, hoje, uma liberdade sexual muito grande, uma diversidade que traz seus efeitos colaterais ruins. Além disso, a falsa impressão de que, por exemplo, se vive com o virus HIV, sem grandes problemas, devido aos avanços no tratamento, leva a uma falsa segurança, levando a uma negligência na hora de se proteger. Vivemos um século de liberdade em todos os sentidos, isso precisa ser dosado e controlado, é preciso ter um equilíbrio.
Como vimos, muitos fatores extras surgiram impactando a fertilidade, estamos longe de atingir o ponto de equilíbrio, por mais que tenhamos avançado, ainda falta muito para se atingir o tratamento perfeito, muito dessa dificuldade ocorre por termos evoluido e mudado nossos hábitos de vida. Apesar de todo o avanço tecnológico, não conseguimos ainda driblar nossa natureza, temos nossas limitações enquanto seres humanos e precisamos aceitar nossos limites como homens e como pesquisadores.
Vamos torcer e buscar avanços e boas soluções para os problemas que nos tornam mais inférteis, mas não esqueçamos de fazer a nossa parte.
Texto escrito por Daniel Diógenes, Diretor Técnico da Clínica Fertibaby Ceará, especialista em Medicina Reprodutiva. Uma reflexão sobre os rumos da fertilidade humana.

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